“Quincey”: outrora ligada a Braintree (e identificada como tal), Quincy é a cidade natal de John Adams e está localizada a cerca de 13 quilômetros de Boston. Depois de apear da presidência, Adams se retirou para a sua fazenda na região. Entre 1812 e sua morte, ele se reaproximou de Thomas Jefferson e manteve com ele uma intensa correspondência. Ambos morreram no mesmo dia, 4 de julho de 1826.
“Se as tropas pudessem…”: carta de Jefferson para Patrick Henry (1736-99), então (março de 1779) governador da Virgínia, na qual tentava convencê-lo, por questões humanitárias e econômicas, a não transferir os prisioneiros de guerra britânicos capturados na Batalha de Saratoga (outubro de 1777) e mantidos no condado de Albemarle.
“cerca de vinte e cinco milhões de pessoas…”: de uma carta de Adams para Jefferson de setembro de 1813 (não 1815, como escreve Pound mais à frente). Nela, fica clara outra discordância entre os dois homens, acerca da possibilidade de se alcançar uma autêntica democracia republicana, escapando da corrupção do sistema e do despotismo aludido no início do Canto. Jefferson era contrário à concentração de poder nas mãos do poder executivo, coisa que Adams julgava necessária.
“garanhões de Teógnis”: alusão ao poeta grego Teógnis de Mégara (570-485 a.C.). Leia AQUI um bom texto sobre ele.
“Chanceler Livingston e o General Humphries”: Robert Livingston (1746-1813), advogado, político e diplomata novaiorquino, era chamado de “chanceler” por ter chefiado o escritório jurídico do estado de Nova York por um quarto de século. Ele integrou o comitê que escreveu a Declaração de Independência. David Humphreys (1752-1818), militar e empreendedor de Connecticut, foi coronel do exército durante a Revolução, ajudante de ordens de Washington e diplomata em Portugal e na Espanha. Em 1802, levou ovelhas da raça merino da Espanha para os EUA, sendo considerado o “pai” da indústria de lã norte-americana.
“kalos k’agathos”, “belo e bom”.
“diferença atribuída…”: de uma carta de Jefferson para Giovanni Fabbroni (v. Canto XXI). Em outra carta citada a seguir, Jefferson sugere a Adams procurar o Grão-Duque de Toscana (na época, Pietro Leopoldo, 1747-92) com vistas a conseguir ajuda financeira para a Guerra de Independência (Adams viajara à Europa com esse objetivo). A menção a Franklin não é por acaso, uma vez que ele gozava de excelente reputação na Europa.
“antes de Lexington”: em 19 abril de 1775, a primeira batalha da Guerra de Independência ocorreu nessa cidadezinha próxima de Boston.
“a remoção seria necessária…”: Pound retorna à carta de Jefferson para Henry.
“Bonaparte, Pobre Diabo!”: pouco antes de Adams escrever essa carta para Jefferson, Bonaparte perdeu a Batalha de Waterloo (18 de junho de 1815) para o general Wellington. A seguir, não se sabe a qual Cromwell o poema se refere: Oliver Cromwell (1599-1658) ou Thomas Cromwell (1485-1540)? Acerca deste último, sugiro a estupenda trilogia Wolf Hall, de Hilary Mantel. Escrevi sobre os dois primeiros volumes AQUI. Wat Tyler (1341-1381), líder da rebelião camponesa de 1381, foi apunhalado pelo prefeito de Londres ao se encontrar com Ricardo II (então com 14 anos) para negociar o fim da sublevação. Conseguiu fugir, mas foi capturado e decapitado. Jack Cade (?-1450) liderou uma rebelião contra Henrique VI em 1450. Ferido ao ser capturado, morreu antes de chegar a Londres para o julgamento. Sobre Arthur Wellesley, 1º Duque de Wellington (1769-1852), já citado anteriormente, e ao contrário do que diz Adams, não era “desprezado por todos os barões, condes” etc. por conta de sua origem irlandesa, tanto que foi considerado um herói nacional e chegou ao cargo de primeiro-ministro. O termo “parvenu” vem do francês “parvenue”, “arrivista”.
“Litterae nihil sanantes”, “a literatura não cura nada”: ao comentar sobre as pesquisas de Jefferson acerca dos povos originários, Adams explicita seu ceticismo para com esse tipo de construção teórica. A mesma atitude pode ser observada mais adiante no Canto, em sua avaliação (negativa) de Platão. Em seguida, ele remete à história de Cadmo e à fundação de Tebas, “se os dentes da serpente produziram homens” (Metamorfoses III, 1-130), referidas no Canto XXVII.
“… nessa violenta tempestade de neve”: no começo da carta para Jefferson (1813), Adams comenta sobre tropas norte-americanas que enfrentaram uma nevasca durante a guerra contra os britânicos (1812-15).
“os velhos Whigs”: referência ao partido britânico, pois, na época dessa carta de Adams (1816), o partido Whig ainda não existia nos EUA.
“pais desta geração”: Pound cita Karl Marx para se referir às consequências hediondas da escravidão para a Grã-Bretanha no século XIX. Em seguida, alude à desregulamentação do trabalho nas fábricas e à falta de pessoal para inspecionar as instalações e o uso de mão-de-obra (inclusive infantil) em condições subumanas.
“Rogier”: Charles Latour Rogier (1800-1885), estadista belga. Marx se refere à situação na Bélgica para corroborar a falta de regulamentação e o uso de mão-de-obra infantil nas fábricas britânicas. Charles Augustus Ellis, Barão Howard de Welden (1799-1868), foi um diplomata inglês.
“Factory Act”: uma das várias leis aprovadas pelo parlamento inglês no decorrer do século XIX para regulamentar as condições de trabalho fabril. No Capital, Marx demonstra como os industriais driblavam essas leis. John Cam Hobhouse (1786-1869), político liberal britânico, promoveu atos legislatórios em 1825 e 1831 destinados a controlar o trabalho infantil e impedir que donos de fábricas pudessem julgar os próprios casos nos tribunais. Leonard Horner (1785-1864) foi um reformador inglês e inspetor do Factory Act de 1848.
“avenement (…) (allemand)”, “a chegada da revolução alemã trouxe novos problemas, o comércio rotineiro [a] ser substituído pela criação de dois fundos, ouro e trigo, destinados ao vitorioso proletariado (alemão)”: o texto citado em francês tem alguns erros gramaticais. A passagem diz respeito à certeza de Stálin de que a revolução comunista na Alemanha era inevitável, e que a URSS devia estar pronta para enviar ajuda.
“bureaucrat paisible (…) sanguinaire”, “Van Tsin Vei, um burocrata pacífico, provou-se bastante incapaz de liderar uma revolução sangrenta”: Wang Jinwei (1883-1944), político chinês, líder do Kuomingtang, Partido Nacionalista Chinês, distanciou-se dos comunistas com o passar do tempo, a despeito de seu apreço pela influência soviética na década de 1920. Besedovsky o chamou de “burocrata pacífico” a fim de dissociá-lo de seu rival, Chiang Kai-Shek, responsável pela unificação da China por meio das armas. Chiang era totalmente imune à influência comunista reinante no partido, ao passo que os agentes de Stálin consideravam Wang muito influenciável. “Monsieur Bessedovsky”: Grigori Zinovyevich Besedovsky (1896-1963), diplomata soviético, serviu na Alemanha, na França e no Japão nos anos 1920. Desertou e fugiu para a França em 1930, ano em que publicou suas memórias, traduzidas para o francês com o título Oui, j’accuse!. Alguns pesquisadores afirmam que a deserção foi falsa, e que Besedovsky (por meio dos livros que publicou) era um agente da propaganda soviética. O retrato de Stálin nas memórias, contudo, não é simpático ao líder soviético.
“Faturas descontadas em taxas exorbitantes…”: com referência às relações comerciais entre a URSS e a Inglaterra, Besedovsky explica que Stálin optou por pagar as contas do país com juros extorsivos, em vez de negociar empréstimos maiores (e taxas menores) com o Midland Bank. Segundo Besedovsky, Stálin temia que relações comerciais mais profundas e harmoniosas poderiam levar à perda do vigor revolucionário. As consequências dessa postura para a população russa foram monstruosas, além de facilitar esquemas de corrupção entre os parceiros comerciais ingleses e os comissários soviéticos, que superfaturavam as transações. A política stalinista de promover revoluções na Alemanha, na China, na França e na Inglaterra também dificultou as relações comerciais da URSS, custo que foi pago pela população mais pobre. Por meio dessas citações, Pound cria um contraste enorme entre a cretinice de Stálin e a inteligência de Adams e Jefferson, evidenciada anteriormente.
“e ele até”: “ele” é William P. G. Harding, presidente do conselho do Federal Reserve em 1920. Pound, aqui, passa a outra fonte: o discurso de S. W. Brookhart (1869-1944) no senado dos EUA em 25 de fevereiro de 1931. Brookhart referiu-se a uma reunião do conselho do Federal Reserve em 1920 para argumentar que “a deflação é um crime” que não deveria ser repetido. Desse modo, ele se posicionou contrariamente à eleição de Eugene Meyer como novo presidente do conselho em 1931, entendendo que Meyer daria continuidade à política deflacionária instituída por Harding.
“Swiftarmoursinclair” Gustavus Franklin Swift (1839-1903) e Philip Danforth Armour (1832-1901) eram rivais na indústria da carne em Chicago. Swift foi o primeiro açougueiro a processar carne na cidade e distribuí-la para outras cidades usando vagões de trem refrigerados. Em 1931, suas empresas eram líderes na indústria. A Sinclair Oil Corporation foi fundada por Harry F. Sinclair em maio de 1916, em Nova York. Essas três empresas sobreviveram à Grande Depressão e ainda existem. A referência à superinflação diz respeito à reunião do conselho do Federal Reserve que decidiu subir os juros a fim de conter a inflação. Óbvio que os banqueiros presentes vazaram a informação aos seus maiores clientes, que puderem contrair empréstimos a juros mais baixos antes que a decisão do conselho fosse colocada em prática.