Canto XXIV

 

“livro dos mandatos”: registro dos pagamentos feitos por Parisina (Laura Malatesta, 1405-1425, prima de Sigismundo), marquesa de Ferrara e esposa de Niccolò III, nos últimos anos de sua vida. O livro foi estudado pelo historiador Alfonso Lazzari, fonte usada por Pound em parte deste Canto.

“Zohanne of Rimini”: Giovanni of Rimini, “maestro de’ nostri barbareschi”. Parisina adorava cavalos e cuidava da participação de Ferrara em corridas.

“barbarisci”: os melhores cavalos de corrida (o nome advém de Barberìa, isto é, o Norte da África, de onde vinham muitos desses cavalos). Alguns versos depois, Pound usa o termo “palio”, que se refere aos cavalos de corrida.

“San Zorzo”: San Giorgio, santo padroeiro de Ferrara.

“ziparello” (ou “zaparello”), uma espécie de casaco curto.

“Ugo fiolo del Signore”, “Ugo, filho do nosso senhor”: Ugo Aldobrandino (1404-1425), filho mais velho de Niccolò e enteado de Parisina, com quem ela se envolveu romanticamente. Um criado descobriu o affair e contou para Niccolò. Este, após flagrá-los, ordenou a execução de ambos, levada a cabo em 21 de maio de 1425.

“27 nov. 1427”; “Procuratio nomine patris”; “Leonello Este”; “Margarita”; “Roberto Malatesta”: agindo em nome do pai (Niccolò, ainda vivo na ocasião), Leonello Este organizou o casamento de sua irmã, Margherita d’Este (1410-1476, filha ilegítima de Niccolò com Stella de’Tolomei), com Galeotto Roberto Malatesta (1411-1432), irmão mais velho de Sigismundo e lorde de Rimini na época. Galeotto morreu quatro anos depois, e Margherita nunca se casou novamente. A filha deles, Constanza (1430-1475), casou-se com um membro da família Farnese. Galeotto era pio e, tendo morrido tão jovem, passou a ser venerado em Rimini como um santo.

“natae prelibati margaritae Ill D. Nicolai Marchionis Esten. et Sponsae”, “em favor de Margarita, filha do supramencionado, o ilustríssimo lorde Niccolò d’Este, e noiva”.

“Don Carlo Malatesta”: Carlo Malatesta (1368-1431), condottiere italiano, irmão de Andrea Malatesta de Cesena e Pandolfo III de Fano. Após a morte de Andrea em 1416, Carlo organizou o casamento de sua sobrinha, Parisina, com Niccolò d’Este, em 1418.

“pub. Ferr.”, “notário público de Ferrara”.

“na vigília de Odisseu”: Pound faz uma analogia entre as errâncias de Odisseu após a Guerra de Troia e a viagem de Niccolò d’Este a Jerusalém, entre abril e julho de 1413. Claro que a viagem de Niccolò, muito bem organizada e luxuosa, tem muito pouco a ver com a longa e atribulada viagem de Odisseu.

“dove fu Elena rapta da Paris”, “onde Helena foi roubada por Páris.”

“Ora vela, ora a remi, sino ad ora di vespero”, “Agora velejando, agora remando, até o anoitecer.”

“Olivet”: o Monte das Oliveiras.

“hic est medium mundi”, “aqui é o centro do mundo.”

“Ego, scriptor cantilenae”, “Eu, o escritor do canto”: Pound intervém para sacanear a noção medieval de que Jerusalém seria o centro do mundo.

“Benché niuno cantasse”, “embora ninguém cantasse.”

“Luchino del Campo”: secretário de Niccolò d’Este, manteve um diário da peregrinação a Jerusalém. Esse registro é a fonte usada por Pound para reconstituir a viagem.

“Aldovrandino”: o chamado Diario Ferrarese afirma que um dos familiares de Ugo, Aldovrandino di Rangoni, foi executado na mesma noite em que ele. Aldovrandino é mencionado no relato de A. Frizzi em Memorie di Ferarra, e também na ópera Parisina, de Mascagni (libreto escrito por D’Annunzio). Seu papel na confusão, entretanto, permanece obscuro.

“1425 vent’uno Maggio”: 21 de maio de 1425, data em que Parisina e Ugo foram executados.

“Fa me hora tagliar la testa (…) mani”, “Corte a minha cabeça, como eu tão rapidamente decapitei Ugo, meu filho, ele disse, mordendo um pedaço de pau que tinha na mão”: Pound parafrseia uma passagem de Memorie di Ferrara, de Frizzi.

“ter pacis Italiae auctor”, “três vezes autor da paz italiana”: a fonte de Pound, Alfonso Lazzari, afirma que Niccolò queria ser o “príncipe da paz” (“il principe della pace”) e “pacificador da Itália” (“pacificatore d’Italia”). Pound enfatiza que essa política pacificadora foi algo buscado por Niccolò e seu filho, Borso.

“Com os meninos puxando os cabos”, “tre cento bastardi” (“trezentos bastardos”): Niccolò, mulherengo inveterado, teria mais de vinte bastardos.

“anulado uma corrida de cavalos”: após a execução, Niccolò enviou mensagens para todos os príncipes italianos, relatando o ocorrido. Em Veneza, segundo Frizzi, o doge Francesco Foscari suspendeu uma corrida de cavalos.

“mataram a mulher de um juiz”: após a execução de Parisina e Ugo, Niccolò ordenou que fossem executadas todas as mulheres adúlteras. A ordem foi revertida pouco depois, mas, antes disso, duas mulheres foram mortas, incluindo a esposa de um juiz, Laodamia delli Romei (citada a seguir). Ela foi decapitada no “pa della justicia”, o palácio da justiça. A outra execução foi de Madonna Agnese, em Modena.

“CHARLES”: Carlos VII, rei da França (1403-1462), agraciou Niccolò com um brasão de armas (conforme decreto citado abaixo).

“Monna Ricarda”: Madonna Ricciarda di Salluzzo (1410-1464) casou-se com Niccolò d’Este em 1429, mas só foi para Ferrara em janeiro de 1431. Teve dois filhos com ele, Ercole e Sigismundo (não o Malatesta, evidentemente).

“scavoir faisans (…) Rabateau”, “dar a conhecer… e chegar… à alta / nobreza de linhagem e casa… e grandes feitos… / valor… afeto… nosso primo citado… / poder, autoridade real… ele e seus descendentes… e / como desejam ter doravante/ PARA SEMPRE EM SEUS BRAÇOS E APOSENTOS / três lírios de ouro… em campo azul rendilhado… / desfrutem e usem. / 1431, conselho em Chinon, o Rei, l’Esne de Trimouill, / Vendoise, [e assinado] Jehan Rabateau.”

“Marchese Saluzzo”: o pai de Monna Riccarda, Thomasso III, morreu em 1416. O irmão dela, Lodovico I de Saluzzo, esteve em Ferrara em 1433. O autor do Diario escreve que Lodovico era o pai de Riccarda, e Pound comete o mesmo erro.

“Hercules”, “piccolo e putino” (“pequeno e jovial”): Ercole d’Este (1431-1505), filho mais velho de Niccolò e Monna Riccarda.

“Polenta”: a família Polenta foi protetora e patrona de Dante Alighieri em seus últimos anos de vida, em Ravenna. Ostasio III da Polenta foi o derradeiro membro da família a ser lorde da cidade. Em 1441, Veneza conquistou Ravenna, e Ostasio morreu no exílio, em Creta, em 1447. É um sinal do que ocorreria com a própria família de Este, que perderia Ferrara para o papado em 1597.

“per diletto”, “por prazer”; o “trabalho noturno” mencionado por Pound é o sexo; “paradiso dei sarti”, “paraíso dos alfaiates”; “feste stomagose”, “banquetes indigestos”.

“Será possível…”: Hermes dirigindo-se a Apolo depois de roubar seu gado, conforme narrado no “Hino Homérico IV”. Pound encontrou uma tradução desse hino no mesmo volume da tradução de Divus da Odisseia.

“Alberto me fez”: quem “fala” é o Palazzo Schifanoia, construído por Alberto I d’Este (1347-1393), pai de Niccolò. Borso o ampliou, redecorou e, entre outras coisas, encomendou a pintura do Salão dos Meses (1467-1470). Na época de Pound, acreditava-se que esse salão havia sido pintado apenas por Cosimo Tura. Hoje, sabe-se que Francesco del Cossa também pintou alguns dos painéis.

“… vendeu a um curtume”: após a extinção da família Este, com a morte de Alfonso II (1533-1597), a cidade foi tomada pelo papa. Durante esse período, o palácio teve vários ocupantes. Entre eles, a família Tassoni, que, em 1789, sublocou o palácio para que a cidade o usasse para processar tabaco. Os afrescos ainda eram visíveis em 1710, mas as paredes foram pintadas depois disso. Os afrescos só foram redescobertos em 1820, por Giuseppe Saroli, e a pintura foi removida em 1841. No entanto, nas décadas seguintes, o palácio continuou a ser utilizado como celeiro, asilo para surdos-mudos e escola. Apenas em 1897 é que foi considerado um museu e restaurado. Os afrescos foram restaurados duas vezes: em 1950-54 e em 1983. Pound viu os afrescos em um péssimo estado, portanto.