“E”: Pound inicia o Canto dessa forma a fim de sublinhar a força das reformas perpetradas por Pietro Leopoldo na Toscana após se tornar Grão-Duque. É algo similar ao início do Canto XXXVII, com aquele “Você não vai (…) metê-los na cadeia por dívidas” de Martin van Buren. Pietro Leopoldo (1747-92), filho de Francisco I e Maria Teresa de Habsburgo, era o irmão caçula de José II, imperador da Áustria. Ele se tornou Grão-Duque da Toscana em 1765 e governou até a morte de seu irmão em 1790, quando se tornou imperador do sacro império romano-germânico como Leopoldo II. A principal fonte de Pound é o volume 6 de Il Monte dei Paschi di Siena e le aziende in esso riunite, a partir do qual delineia as reformas de Leopoldo (que elenca no início e no final do poema, e a elas retorna no Canto L), em especial a legislação introduzida em 1766.
“motu proprio”, “por seu próprio impulso”: decreto feito por iniciativa do rei ou governante.
“Ferdinando”: Ferdinando III (1769-1824), segundo filho de Pietro Leopoldo, tornou-se Grã-Duque em 1790. Seu irmão mais velho, Francisco, tornou-se imperador após a morte de seu pai em 1790. Ferdinando foi forçado a deixar o ducado quando da invasão da Itália por Napoleão, em 1799. Ele fugiu para Viena e abdicou em 1801, mas retornou quando Napoleão foi derrotado, em 1814, e governou a Toscana até morrer, em 1824.
“Bandeiras, trombetas…”: houve uma celebração pública em Siena quando Ferdinando proibiu a exportação de grãos em 5 de dezembro de 1792. Pound aprovava a autossuficiência, e acreditava que a primeira obrigação de todo governante é para com seus súditos locais.
“di tutte le qualità”, “de todos os tipos”: isto é, pessoas de todas as classes sociais. Nos versos anteriores, Pound se refere a diversos locais e edifícios de Siena, como a Capela de Alexandre e o Palácio dos Senhores (o Palazzo Pubblico, a câmara da cidade).
“mortaretti”, “pequenos morteiros”.”Evviva Ferdinando il Terzo”, “Viva Ferdinando III”. “Dovizia annonaria”, “abundância de provisões”.
“Frumentorum licentia (…) conservit”: no original, “Frumentariorum licentia coercita / Re annonaria laxata / Pauperum aeque ac divitum bono / consuluerit”, “(Para a segurança / de Ferdinando III da Áustria / porque /) quando a licença dos comerciantes de milho foi restringida / e as provisões foram reduzidas / ele tomou medidas / para o bem dos pobres e dos ricos”. “Frumentorum” é um erro do impressor, apontado por Pound em suas anotações; o correto seria “Frumentariorum”, e o “Re” deveria ser “De”. Pound errou ao transcrever “consuluerit” como “conservit” no Canto.
“1796”: na verdade, conforma já assinalado acima, “il più galantuomo del paese” (“o cavalheiro mais gentil do país”), fugiu da Toscana em 1799. A referência ao “padre cidadão” aponta para o domínio napoleônico, pois, conforme o vocabulário revolucionário francês, todos eram “cidadãos”. Pound também sublinha a inflação da fanga de trigo após a chegada de Napoleão, de 7,50 para 12 scudi.
“… vieram homens de Arezzo”: de fato, forças italianas foram a Siena para tentar expulsar os invasores, mas, em vez de atacar os franceses no castelo, fizeram um pogrom, perseguindo e matando a população judia. Quando, em 3 de julho, finalmente atacaram o forte, descobriram que tinham sido sabotados. Napoleão restabeleceu o controle sobre a Toscana após a Batalha de Marengo, em 14 de junho de 1800.
“respectons les prêtres”, “respeite os padres”: em carta para Talleyrand (1754-1838) de 22 de novembro de 1800, Napoleão disse que, para evitar rebeliões dos camponeses italianos, era preciso respeitar os clérigos locais.
“Premier Brumaire”: no calendário revolucionário francês, brumário era o mês que ia de 20 de outubro a 20 de novembro. “Vous voudrez citoyen”, “Cidadãos, vocês irão”.
“Delort”: Jacques Antoine Adrien Baron Delort (1773-1846), oficial do exército de Bonaparte. “Dupont”: Pierre-Antoine, Conde Dupont de l’Étang (1765-1840), outro oficial.
“Luis Rei da Etrúria, Primus”: após conquistar a Itália, Napoleão queria que a Espanha se tornasse sua aliada contra os ingleses. Para tanto, ele tornou Luís, o duque de Parma (e membro da família Bourbon, que governava a Espanha), rei da Etrúria, reino recém-criado na Toscana que existiu por sete anos (1801-1807). Luís morreu de epilepsia em 1803. Sua viúva, Maria Luísa, tornou-se regente (Carlos Luís, filho de ambos, era menor de idade). Ferdinando III foi compensado com o Eleitorado de Salzburgo.
“Gen. Clarke”: Henri Jacques Guillaume Clarke (1765-1818), franco-irlandês que iniciou a carreira nas guerras revolucionárias francesas.
“Ministro degli Esteri”, “Ministro das Relações Exteriores”: no caso, Talleyrand.
“proveitos do Monte”: juros então correntes no Monte dei Paschi.
“Madame / ma soeur et cousine”, “Madame / minha irmã e prima”: de uma carta de Maria Luísa, viúva de Luís I, rei da Etrúria, em 1807, depois que Napoleão extinguiu o reino e queria que a região da Toscana fosse anexada pela França. Maria Luísa era filha do rei Carlos IV, da Espanha, e queria voltar para casa.
“General Reile”: Honoré Charles Michel Joseph Reille (1775-1860), do exército de Napoleão.
“importar tropas de Lisboa”: na fonte original, lê-se “Livorno”. Pound deve ter se confundido porque a próxima na fila de conquistas napoleônicas foi Lisboa, como se vê a seguir. Bonaparte invadiu Portugal no dia 19 de novembro de 1807, forçando a família real a fugir para o Brasil. A resistência portuguesa ganhou corpo em julho de 1808. Em agosto, sob o comando de Arthur Wellesley, tropas britânicas aportaram na Baía do Mondego, e teve início a Guerra Peninsular. Napoleão e Maria Luísa se encontraram em Milão, mas não chegaram a um acordo. Ele prometeu a ela o Reino da Lusitânia do Norte, isto é, a região correspondente de Portugal, após a conquista do país pelas forças franco-espanholas e conforme o Tratado de Fontainebleau (que também anexou a Etrúria à França). Napoleão queria que Maria Luísa se casasse com seu (dele) irmão, Lucien Bonaparte, mas ambos se recusaram: Lucien teria de se divorciar da esposa, a quem era apegado, e Maria Luísa não queria tomar o que era de sua irmã mais velha, Carlota Joaquina. Napoleão, então, quis que Maria Luísa se estabelecesse em Nice ou Turim, mas ela preferiu se juntar aos pais na Espanha, o que eventualmente ocorreu.
“aqueles homens”: em 14 de maio de 1809, Napoleão deu o ducado da Toscana para sua irmã, Maria Ana Elisa Bonaparte (1777-1820), princesa de Lucca e Piombino. O diarista Francesco Antonio Bandini (c.1762-1838) relatou que, quando ela entrou em Siena, os homens tiraram os cavalos de sua carruagem e a puxaram, mas que ele tinha certeza de que a ação não foi baseada em entusiasmo genuíno. Os diários de Bandini estão na biblioteca pública de Siena.
“‘Semíramis'”: Maria Ana Elisa Bonaparte foi comparada com a rainha Semíramis, da Babilônia, por seu apoio às artes.
“E antes dele”: após comentar as melhorias feitas por Bonaparte, Narciso Mengozzi retorna a Pietro Leopoldo e, por três páginas, elenca suas reformas, terminando com as introduzidas por Ferdinando III. Pound coloca a redução da dívida pública no topo da lista.
“mortmain”, “morte main”, “mão morta”: privilégio da propriedade perpétua da terra, geralmente concedido ao clero, mas também às corporações.
“Val di Chiana”: vale do rio Chiana, na Toscana. A referência ao “porto franco” se refere ao fato de que Leopoldo II, filho e sucessor de Ferdinando III, abriu o porto de Livorno.
“Madame Letizia”: Maria Letícia Ramolino Bonaparte (1750-1836), mãe de Napoleão. Ela esteve em Siena entre 3 a 13 de agosto de 1815. A visita de um membro da família Bonaparte em Siena, dois meses após a Batalha de Waterloo, tornou-se uma notícia qualquer, registrada pelo diarista Bandini.
“Provveditore”, “supervisor”.