Um prólogo.

Abaixo, na íntegra, o prólogo do meu novo romance, que será lançado pela Record em 2023. Publiquei uma versão anterior desse mesmo trecho meses atrás. Esta é a versão final (acho). O romance é uma narrativa policialesca, espécie de “pequi noir que se passa sobretudo em Goiás e Brasília, em 1983. A imagem que ilustra o post é Garota com arma rosa (óleo sobre tela, 2012), de Claudia Alvarez.

………

P R Ó L O G O

T Á R T A R O

[1º.ABR.1983]

Desci ontem ao centro da cidade, ele diz após riscar um fósforo e antes de acender o cigarro que pende da boca, o levíssimo sotaque estrangeiro e a voz meio empostada insuflando cada vogal com algo que remete à ameaça de um bocejo. Dei uma boa olhada na festa.
Festa?
Uma primeira tragada, os olhos fixos na água corrente, depois na ponta do cigarro encaixado entre os dedos indicador e médio da mão direita, mão que agora repousa sobre a coxa. As cadeiras de metal a três passos da água; ele as trouxe no porta-malas do carro, emprestadas pelo pai dela, a ideia de se sentar no chão ou numa toalha estendida não apetecendo a nenhum dos dois. Estão ambos descalços, com bonés e roupas de banho, ela de biquini verde e bermuda jeans, ele usando uma sunga azul e uma camiseta com a bandeira do Arizona estampada, os treze raios vermelhos e dourados como o pôr-do-sol no estado do Grand Canyon, treze como as treze colônias originais, e a estrela acobreada, tenho um amigo que mora em Scottsdale, explicou minutos antes, comprei isso na última vez em que passei por lá para visitá-lo, ele não anda nada bem. No chão, entre as cadeiras, três garrafas grandes de água mineral, uma delas aberta e pela metade, e uma sacola plástica com a boca aberta e os restos do café da manhã: nacos e farelos de biscoitos de queijo e sanduíches de mortadela, dois caroços de maçã, três latinhas de refrigerante, vazias e meio amassadas, além de um amontoado de cascas de amendoim.
Festa?
Ele se abaixa e deixa o maço de Dunhill e o pacote de fósforos no chão, ao lado das garrafas de água mineral, depois alcança, em meio aos restos, uma das latinhas para usar como cinzeiro, endireita o corpo e dá outra tragada. Vou parar de fumar depois da páscoa, diz, batendo as cinzas.
Desde quando ateu faz promessa desse tipo?
Não sou ateu, e não é uma promessa.
Ah, não?
Uma decisão, só isso.
Uma escolha?
Sim, ele responde, abrindo os braços e um sorriso. Contemple as minhas boas escolhas.
Prefiro contemplar as suas bolas.
Minhas bolas ficam lisonjeadas.
E não é uma festa.
O quê?
Não sei se dá pra chamar aquilo de festa.
E chamaremos de quê?
Acho que o nome certo é procissão mesmo.
O nome correto?
Isso. Correto, apropriado.
Procissão, ele diz e sorri outra vez, depois leva o cigarro à boca, fechando os olhos ao tragar.
Procissão. Isso aí.
Expelindo a fumaça para o céu aberto: Certo. O que mais?
Também não sei se dá pra dizer que você desceu.
Mas eu senti como se descesse.
Ela cantarola: “Da planície racional, uns desceram sem razão…” Sabe o que foi essa porcaria toda?
Não, mas consigo imaginar.
Cachaça. Muita cachaça ontem.
Bebi menos do que você.
Sim, mas é disso que se trata.
Disso o quê?
Você bebeu muito e sentiu como se descesse. Eu bebi ainda mais e senti como se… qual é mesmo a palavra?… ascendesse.
Ele gargalha, batendo as cinzas na boca da latinha. Você ascendeu, sim, pequena.
Não foi?
Uma nova tragada e: Foi, sim. Você ascendeu do chão do banheiro à boca da privada e, entre uma golfada e outra, calhou de fazer umas previsões apocalípticas.
Ela sorri, satisfeita consigo mesma. É, acho que fiz isso.
Sim, você fez.
Eu fiz, sim.
E houve quem achasse assustador.
Claro que houve.
A velha do quarto vizinho disse que você estava possuída.
Uma gargalhada sincera, a cabeça lançada para trás. Ai, ai, ai. Quem sabe, né?
Mas você se lembra das coisas que falou?
Mais ou menos.
Entre outras bobagens que não consegui discernir, você disse que Goiás será consumido pelo fogo, e que isso vai acontecer muito em breve.
Mas isso não é uma bobagem.
Ah, não?
E não é uma previsão apocalíptica. Isso é uma previsão agrária. Essa merda acontece todo ano.
A dona da pousada veio falar comigo ontem à noite, quando voltei da procissão.
Falar o quê?
Ela ficou preocupada com o seu estado.
Vou sobreviver.
Foi o que eu disse pra ela. A velha e outros hóspedes reclamaram. Disseram que a nossa conduta foi um tanto desrespeitosa. Creio que alguém usou o termo “blasfêmia”. Estamos na Semana Santa, afinal.
E?
Nada. Você vai sobreviver. E a dona da pousada segurava o riso ao falar comigo. Acho que não estamos enrascados.
E os carolas que se fodam.
Porque alguém precisa se foder.
Sempre.
Outra tragada e ele se lembra de que: Era engraçado como você pronunciava fogo, engrossando a voz e subindo o tom de repente, e depois gargalhava de um jeito meio demoníaco.
Ou seja, a apreensão dos fiéis é compreensível.
Bastante compreensível.
Mas, agora que eu sei de tudo isso, sabe o que não é compreensível? Me deixar sozinha naquela merda de pousada, à mercê desses desvairados.
Você caiu no sono. Parecia bem.
Apedrejamentos, cruzadas e linchamentos foram promovidos por menos que minhas palavras junto à privada, eminência.
Suas previsões agrárias.
O fogo caminha com as próprias pernas.
Assim como eu. Saí e voltei bem rápido, você nem se deu conta.
Me deixou sozinha naquela bosta de quarto.
Eu queria ver a procissão, já que viemos até aqui.
Um turista.
Quando me convém. E agora os meus pés estão me matando.
O que dói é a porra da minha cabeça, ela esfrega os olhos com o polegar e o indicador da mão esquerda. Preciso rebater.
Achei muito bonita a procissão.
O turista achou muito bonita a procissão e disse: “Achei muito bonita a procissão”, disse o turista, que achou muito bonita a procissão.
Uma risada curta e ele dá uma última tragada, depois se abaixa, apaga o cigarro numa das pernas da cadeira e joga a guimba dentro da latinha, que devolve à sacola com os restos. Em seguida, endireita o corpo e corrige: Turista, não. Visitante.
Tá bom. O visitante achou muito bonita a procissão.
Achei mesmo. Estou falando sério. As luzes da cidade apagadas e todas aquelas tochas e velas, os tambores, a cantoria das pessoas. Só as roupas são meio tenebrosas.
Farricocos.
Como?
Tá falando das roupas dos caras que levam as tochas?
Sim.
Eles são chamados de farricocos. Representam os soldados romanos que vão atrás de Cristo.
Ah, sim. Essa parte eu entendi. Também gostei que Jesus seja representado por um… qual é o nome daquilo mesmo?
Sei lá. Estandarte?
Isso. Gostei que Jesus seja representado por um estandarte, e não por um ator não profissional, um amador de carne, osso e sotaque goiano.
Não é fácil ser o Messias.
Imagino que não.
Ainda mais em Goiás.
Não creio que seja fácil em lugar nenhum.
Mas você tem razão, é bem melhor usar a joça desse estandarte do que, sei lá, botar uma fantasia no sobrinho barbudo do sacristão.
Você sabe de onde é que veio tudo isso? Como foi que começou?
Ela respira fundo, coçando o queixo. Acho que um padre começou a brincadeira uns duzentos anos atrás. Claro que o troço não nasceu aqui, em Goiás. Lá na terrinha, na época da Inquisição, a brincadeira já rolava.
Bons tempos.
Ainda rola, na verdade.
Na Europa?
Em Portugal.
A Inquisição?
Não, seu palhaço. A procissão.
Foi o que eu imaginei.
Procissão do Ecce Homo ou das Endoenças.
Como é que você sabe de tudo isso?
Encolhe os ombros: Ué, sabendo. A procissão acontece todo ano, é claro. E todo ano tem matéria no jornal, na TV, e o escambau. Do que mais os caras vão falar na quaresma?
Endoenças, você disse?
Sim. Porque é na Quinta-Feira Santa, o dia das endoenças, das indulgências, do perdão, da limpeza.
Em vista de tudo isso, ele diz, meio sério, preciso confessar uma coisa.
Eu quero saber?
Não estou me sentindo particularmente limpo nesta manhã.
São as companhias.
Talvez eu dê um mergulho.
Mergulhou ontem.
Eu? Onde?
Na procissão. Sozinho.
Ah, sim. E meus pés estão me matando.
Acho que você consegue imaginar o quanto a brincadeira era mais animada no século XVIII, né? A galera se entregando à autoflagelação no meio da rua e tudo o mais.
E você não chama isso de festa?
Viu alguém chicoteando o próprio lombo ontem?
Infelizmente, não.
Ou, sei lá, o lombo de outro desvairado?
Infelizmente, não. Mas estava escuro.
E o senhor, bêbado.
Menos do que você.
Ascender é complicado.
Eu não saberia dizer.
Ela ri, esfregando os olhos outra vez. Nunca participei de procissão nenhuma. Acho tudo isso meio… sei lá.
Nenhum sentimento oceânico.
Não começa.
Quem sugeriu essa viagem foi você.
Não essa viagem. Não vim aqui pra acompanhar porra nenhuma de procissão.
Você não acompanhou a procissão.
Queria mesmo era vir pra cá.
Pra beira do rio.
Pra beira do rio, longe de todo mundo.
E aqui estamos.
Aqui estamos. Não vai mergulhar?
Pensando melhor, não.
Vou dar um pulinho no carro e pegar a cachaça.
Hora de rebater.
Hora de rebater.
Rebater. Sua ideia de endoença.
Como o senhor é perspicaz, ela diz e se levanta com dificuldade, ajeita a bermuda e capenga os doze metros até o Landau. Mas, antes de pegar a garrafa, para junto à traseira do carro, apoia-se no porta-malas e devolve o desjejum ao mundo exterior. Refrigerante, amendoim, biscoitinhos, pão, mortadela e queijo. Puta que pariu.
Dia das Endoenças, ouve, e uma gargalhada.
Vai tomar no cu!, berra. Isso foi ontem.
Se você diz.
Ela se abaixa e vomita mais um pouco. Acho que é tudo, pensa um instante depois. Biscoitinho maldito. E essa mortadela. E os amendoins que comeu a caminho dali, sacolejando na estrada. Queimação. Como se tivesse engolido as quarenta tochas dos farricocos. Ecce estômago. Minha procissão interior. Haja fígado. Ou do interior pro exterior. Ascensão? Espera mais um pouco. Ascensão. Então, contorna o carro, abre a porta do passageiro e alcança uma das garrafas sob o banco. Pouco mais de um terço. Alambique local. Fabricação artesanal. Os litros comprados num boteco de beira de estrada, não muito longe da cidade. Dois deles. Ou seja, na noite anterior, entornaram quase um litro, fora as cervejas. Eu entornei. Sim, a maior parte sozinha, porque esse gringo viado só fica bebericando. Quase dois terços. Uau. Melhor rebater mesmo. Vinde a mim o Cão. Tira a rolha, respira fundo. Um gole. Fogo. Como se tivesse engolido as quarenta tochas e os farricocos. Firma o golpe. Isso. Segura essa joça aí dentro. Isso, mulher. Contar até. Dez? Mais. Passado um minuto, a coisa parece se assentar. Sim: nem sinal de uma possível nova devolução. O poder de ablução da cachaça. O que ele tá cantarolando lá embaixo? Minha ideia de endoença: rebater. I get ideas, I get ideas. Mais um golezinho. Que belo vozeirão. Se o estômago é por nós, quem será contra nós? Ele canta safadezas. Estômago. Ele faz safadezas. Estômago, fígado. Ele vive de safadezas. Estômago, fígado, cabeça. Enfim. Cabeça: invadida a terra sacripanta. Cercada a cidadela. Derrubados os portões. Rompida a derradeira linha de defesa. Abatida a usurpadora — ressaca. Cabeças fincadas em estacas, nos muros, mas não a minha, jamais a minha. Agora: caos, pilhagem e devastação. É isso aí.
Na beira do rio, ele acendeu outro cigarro. Melhor?
Nada como o cheiro de vômito pela manhã, ela responde e, em vez de se sentar, coloca a garrafa no chão com todo o cuidado, livra-se da bermuda e a pendura no encosto da cadeira. Em seguida, alcança uma das garrafas de água mineral, abre e toma um gole bem longo, fecha, recoloca onde estava, entre as cadeiras, vira-se, pega a garrafa de cachaça e avança alguns passos, adentrando o rio até que a água cubra os joelhos. A correnteza ali não é forte. Ela se vira e mergulha a metade inferior da garrafa, malditos grãos de areia, depois se abaixa e, com a outra mão, joga um pouco de água no rosto, esfregando os olhos e os lábios. Quando termina, encara o homem sentado na margem. Uma troca de sorrisos. Do que é que eu falava mesmo, eminência?
Do cheiro de vômito pela manhã.
Ah, sim.
Que tal?
Cheira a vitória.
Se você diz.
Eu digo.
Cuidado pra não molhar o curativo.
Olha para a própria barriga e sorri. Essa porra tá quase boa.
Se você diz.
Eu digo, e em seguida tira a rolha da garrafa e toma outro gole. A careta se confunde com uma risada, e a risada dá lugar a um arroto curto, mas: Auspicioso. Curada, doutor.
Quase.
Quase. Seguimos.
Seguimos, ele repete, desviando os olhos para o rio. Bate as cinzas na boca da latinha. E diz, bem alto: Riverrun.
Que merda é essa?
Um rugido que precede um trovão.
Tá mais prum arroto, talvez?
O que você quiser que seja.
Se incomoda se eu…?
O quê? Ah, não. Capricha.
Não obstante estarem em plena Sexta-Feira da Paixão, a imagem é algo carnavalesca: ela puxa o biquini para o lado e deita um formidável jato de urina no leito do rio, dizendo com os olhos voltados para baixo: Note a alvura do mijo, excelência. Sublinhe, frise, destaque, celebre. Amarelo-claro, na verdade. Sim, excelência. Pareço saudável.
Prankquean, diz ele.
É a mãe.
Uma princesa.
Nesse caso, sorri, ajeitando o biquini, três tapinhas no púbis, euzinha mesmo.
Ele repete os gestos de antes: uma última tragada e se abaixa, apaga o cigarro numa das pernas da cadeira, depois joga a guimba dentro da latinha, que devolve à sacola com os restos. Me dá um gole, pede ao endireitar o corpo.
Dê-me um gole, diz a gramática do professor e do aluno e, salvo engano, do mulato sabido.
Sou um bom negro, retruca, piscando o olho esquerdo. Anda logo.
Rindo, vai até ele e diz ao estender a garrafa: Mas não da Nação Brasileira. Aqui, meu bom senhor.
Mas não da Nação Brasileira, ele concorda, pegando a garrafa. Agradecido, senhorita.
A senhorita vai se sentar, ela diz, sentando-se. E a senhorita acha que devia ter rebatido antes de comer. Devia ter rebatido antes de escovar os dentes, antes de levantar da cama, antes de abrir os olhos. Porra, a senhorita acha que devia ter rebatido antes de acordar.
Ele respira fundo e dá um golezinho, depois outro, e faz uma careta medonha.
Tudo bem por aí?
Deus me perdoe, mas estou pensando no meu fígado.
Não penso muito no meu, mas sei o que ele pensa de mim.
Devolve a garrafa, tossindo três vezes em sequência. Acho que vou me ater à cerveja a aos destilados mais amigáveis daqui por diante.
Outra promessa de ateu?
Quem vomitou foi você.
Um momento, coronel. Eu vomitei o desjejum antes de dar início aos trabalhos. Logo, a cachaça que ingeri está onde deveria estar, no estômago e pela corrente sanguínea, a caminho da cabeça.
E ontem? Vomitou o quê?
Ontem, conforme já discutimos e atestaram os testemunhos colhidos nas proximidades da cena do crime ou, melhor dizendo, nas proximidades da ocorrência, ontem foi um caso evidente de possessão demoníaca.
Ele sorri, concordando com a cabeça. Quando você foi ao carro, fiquei pensando que aqui é um bom lugar pra acampar.
Deve ser.
Embora eu não tenha mais idade pra dormir no meio do mato, dentro de uma barraca, ou consiga passar a noite ao redor de uma fogueira.
Fogueiras: melhor evitar.
Sobretudo em Goiás.
É isso aí. Ainda mais em Goiás.
William costuma vir aqui, certo? Pescar?
Sim. Quer dizer, não aqui, exatamente. Um pouco mais pra baixo. E também pros lados do Mato Grosso, perto da divisa dos estados. Britânia.
Britânia?
É o nome de uma cidade.
Ele sorri: Claro que é.
Meu pai gosta muito de pescar no Rio Vermelho.
E você?
Eu? Não, pescar não é comigo, não.
E ela negou três vezes.
Não, não e não. É isso aí.
William nunca te convidou?
Ele sempre me convida. Ele convida todo mundo, o tempo inteiro, sem parar. A vida dele é uma longa pescaria, com alguns intervalos. Quando não tá pescando, tá chamando os outros pra pescar. Ele já convidou você.
Sim, é verdade. Várias e várias vezes. Siga-me, e eu farei de você pescador de peixes.
Não, não e não.
Estive com ele na segunda-feira.
Ela toma um golezinho, pressentindo que a maldita conversa se aproxima e não terá para onde fugir. Colocaram o papo em dia?
Falamos sobre a sua barriga.
Um sorriso, a boca da garrafa ainda tocando os lábios. Ora, mas que surpresa, não é mesmo?
Quero saber o que aconteceu, pequena.
Gosto de como você vai direto ao ponto.
Direto ao ponto? Estamos juntos desde ontem e só agora perguntei a respeito.
Tecnicamente, você ainda não perguntou.
Não seja por isso. O que aconteceu?
Bom, ela pensa, tomando outro gole curto, se é pra falar dessa merda, melhor que seja agora e aqui, na beira do rio, uma conversa movida a cachaça e gracinhas, e não entocados num quarto de pousada ou no carro, ressacados, pegando a estrada. E diz, recolocando a rolha: Tá bom. O que aconteceu? Um corte. Fui cortada. Alguém me cortou.
E quanto aos detalhes?
Sorri: Claro, excelência. Os detalhes.
Olha para ela, sério: Sim, os detalhes. Por favor.
Eu acho que…
Não me entenda mal. Não quero te chatear, não quero te encher o saco. Sei como esse tipo de conversa pode ser sacal.
Quer o quê, então?
Eu me preocupo com você. Só isso. E não vou poder te ajudar se não souber o que aconteceu. Não me entenda mal.
O sorriso desapareceu, os olhos agora fixos na outra margem. No barranco. Eu sei, diz, passado um momento. Eu sei.
Parece que William e o Velho se estranharam.
Eu soube.
Você não está preocupada?
Um pouco, mas que merda eu posso fazer? E que merda eu podia fazer naquelas circunstâncias?
Eu não sei das circunstâncias. Não sei dos detalhes.
Tava fora.
Eu estava fora.
Tem passado muito tempo fora.
Trabalho. Que merda eu posso fazer?
É, eu sei.
Vai me contar o que aconteceu?
Vou te contar o que aconteceu.
Estou ouvindo.
Quê que você sabe?
Sei de uma confusão num boteco. Sei que você foi a esse lugar a pedido de alguém. Sei que acabou se machucando. E sei que sobrou pra essa outra pessoa, a pessoa que te machucou.
Sabe de uma coisa ou outra.
Algumas. Poucas.
É, poucas.
Como disse, não sei dos detalhes.
Não foi num boteco.
Não?
Foi num puteiro.
E o puteiro é do Velho? Daí a confusão?
Não, não, não. O puteiro não é do Velho.
E de quem é?
Arranca a rolha, frustrada, e toma outro gole, depois respira fundo. Ok, meritíssimo. Vamos aos detalhes. Conhece o Abaporu?
O quadro?
Não, caralho. O puteiro.
Abaporu?
Tem um puteiro com esse nome em Goiânia. Pensei que um cavalheiro como o senhor, enturmado como é, conhecesse o Abaporu.
Não frequento puteiros.
Mas frequenta pessoas que frequentam puteiros, e as pessoas falam, contam histórias, comentam, sei lá.
Abaporu.
Abaporu. Depois dessa história, é o Devil’s Whorehouse da música dos caras. Puta que pariu. Quando eu peco, peco pra valer.
Música de quem?
Como, de quem? Vou nem responder essa. Eu, hein? O senhor é um filisteu.
Depois eu procuro saber. Dou uma olhada nos seus discos.
A dona do Abaporu, Elizete, é amiga do meu pai. Amiga desde os tempos dele na Civil, sabe?
Sim, mas por que o puteiro se chama Abaporu?
Porque a Elizete teve elefantíase.
Uma gargalhada. Claro, claro.
O lugar tem outro nome, na verdade, mas algum engraçadinho apelidou de Abaporu e todo mundo só chama assim, inclusive quem não faz ideia do que significa a porra desse nome.
Entendi.
Eu tava na casa do meu pai, sozinha. Ele foi pescar numa chácara perto de Anápolis e me deixou lá, disse que voltava no domingo e a gente ia almoçar num lugar bacana. Passei a tarde de sábado na beira da piscina, fiz umas caipirinhas, ouvi música, e depois, à noite, pedi uma pizza, comi e fui cedo pra cama. Acordei com o telefone tocando. Duas da manhã, por aí.
Elizete.
A própria. Tava desesperada. Um sujeito tinha comido uma puta e se recusava a pagar porque a moça teria chupado o pau dele com uma bruta má vontade.
Acontece.
E aconteceu dele dar uns socos na cara da menina e chutar ela até um segurança entrar no quarto e deitar o imbecil na porrada. E agora cê deve tá pensando: um peão batendo numa puta a troco de nada?
Acontece o tempo todo.
E, porque acontece o tempo todo: o que Isabel e William têm a ver com essa confusão?
Você imita a minha voz muito mal, mas, sim, o que você e William têm a ver com essa confusão?
A questão, eminência, é quem era o sujeito, e o que fizeram com ele.
São duas questões, então.
Foda-se. A Elizete foi até o quarto pra ver o que tinha acontecido e reconheceu o desgraçado. Ele não era um peão, não era um cliente qualquer, não era um eletricista, contador ou borracheiro farreando no dia do pagamento. Nada disso. Ele era um funcionário do Velho. E a Elizete entrou em desespero, não sabia o que fazer. Daí, mandou o segurança arrastar o sujeito pro escritório dela, amarrar numa cadeira e amordaçar.
Que ideia estúpida.
Depois, ligou pra casa do meu pai.
Que não estava.
Mas eu, sim.
E você foi até lá.
Fui. Bêbada e desarmada, mas fui.
E por que foi desarmada?
Porque tava bêbada, chapada, morrendo de sono, saí numa correria desembestada e… enfim.
Enfim?
Foi isso. Cagada minha.
E o que aconteceu?
Cheguei lá e a cena era uma beleza. Todo mundo no escritório, o sujeito amarrado numa cadeira, pelado e com a fuça estourada, o segurança com cara de bunda, a menina com o nariz e uns dentes quebrados, segurando uma fronha de travesseiro assim junto da boca e gemendo de dor, e a Elizete arrancando os cabelos. Tirei a mordaça do imbecil e perguntei se ele me conhecia. Ele disse que me conhecia e conhecia o meu pai. Perguntei se não seria o caso de resolver a situação sem criar mais problema pra ninguém. Desescalar a coisa, por assim dizer. Ele respirou fundo e, pra minha surpresa, foi incrivelmente sensato. Disse que tava mais calmo e menos bêbado, pediu todas as desculpas do mundo, pediu que fosse desamarrado, disse que só queria tomar um banho e se vestir, disse que é claro que ia pagar tudo o que devia, arcar com todos os prejuízos, incluindo o conserto dos dentes da moça, ele disse moça, não puta, disse que ia pagar tudinho e iria embora numa boa, sem criar caso. Eu queria conversar mais um pouco, ver qual era, mas a Elizete já foi logo mandando o segurança desamarrar o cara.
Outra ideia estúpida.
Tanto quanto o segurança, que não conseguia desfazer a porra do nó.
O que ele fez?
Puxou um canivete.
É claro que ele puxou um canivete.
Puxou um canivete e cortou a corda. Só vi a cotovelada bem no meio da cara do segurança e o canivete já na mão do outro, que me deu um pontapé no peito e voou pra cima da moça. Ela tava sentadinha no sofá, coitada, zonza, mais preocupada com o sangue que ainda botava pelo nariz e pela boca, acho que nem entendeu direito o que acontecia. Ele meteu o canivete nela com gosto.
E o que você fez?
Bom, tudo isso aconteceu bem rápido, ele quebrar o nariz do segurança, pegar o canivete, me chutar e começar a furar a menina daquele jeito. Assim que consegui me levantar, alcancei uma garrafa quase vazia de Natu Nobilis que tava em cima da mesa e acertei na cabeça do vagabundo. Achei que ia ganhar um tempinho com isso, talvez até desmaiar o corno, mas ele já se virou rasgando a minha barriga. Dei um pulo pra trás, meio desequilibrada, mas consegui pegar uma cadeira e, a partir daí, a gente ficou se rodeando no meio do escritório, ele pelado e rindo e coberto de sangue, a moça estrebuchando, caída assim de lado no sofá, uns furos horríveis no pescoço, nos peitos e até na cara, o segurança ainda largado no chão, com o nariz sangrando, sendo inútil como só homem sabe ser nessas horas, e a burra da Elizete com os olhos esbugalhados atrás da mesa, paralisada. Não sei quanto tempo a gente ficou nisso, ele com o canivete na mão, rindo e xingando sem parar, e eu segurando a garrafa quebrada com a mão direita e a cadeira com a esquerda, igual a uma domadora.
Bela imagem.
Só diz isso porque não tava lá no meu lugar.
Em geral, é assim que funciona.
O quê?
As coisas que a gente diz.
Não é fácil a vida no circo.
Prossiga, por gentileza.
Pois não. Como eu disse, não sei quanto tempo a gente ficou se rodeando daquele jeito. Provável que menos de um minuto, mas pareceu uma eternidade, sabe como é. O corte na minha barriga sangrava um bocado, meu peito doía feito o diabo por causa do chute, e eu me lembro de ficar ali pensando que tava fodida porque não ia demorar muito pra desmaiar, o cara ia pular em cima de mim e me furar igual furou a coitada da menina. Só sei que, felizmente, a Elizete saiu do coma e resolveu tomar uma atitude, porque o desgraçado acusou um golpe assim do nada, soltou o canivete e colocou as duas mãos na boca do estômago.
Você não ouviu o tiro?
Não, não ouvi porcaria nenhuma, meus ouvidos tavam um zumbido só, e eu nem sabia que a paspalha da Elizete tinha uma arma ali, ou tinha pegado ao chegar, antes que desamarrassem o vagabundo. Primeira coisa que teria feito, pode apostar. Olhei pro lado e vi o 22 na mão da Elizete. Olhei pro sujeito e ele se tremia todo, tinha começado a chorar. Um bocado de merda escorria pelas pernas dele. Larguei a cadeira e a garrafa, tomei o revólver da mão da Elizete, cheguei bem perto do babaca e dei um tiro nos bagos dele. O cara foi direto pro chão e ficou lá se contorcendo e soltando uns berros curtos, como se não tivesse mais fôlego, todo encolhido e sujo de sangue e de bosta.
Caramba.
Gostou dessa imagem também?
Não é fácil a vida no circo.
Foi o que eu falei.
Foi o que você falou.
O desgraçado demorou um bocado pra morrer.
E depois?
Falei pra Elizete empacotar os corpos do jeito que desse, limpar a sujeira e mandar o segurança ou algum outro inútil que trabalhasse pra ela atrás do meu pai. Expliquei onde ele tinha ido pescar e tudo.
Quem cuidou do seu ferimento?
Liguei pro Chiquinho e ele mandou uma conhecida nossa, auxiliar de enfermagem. Ela fez o serviço lá no puteiro mesmo, num dos quartos. Trabalhou direitinho. Não infeccionou nem nada. Dormi por lá. Quando acordei, já tinham limpado a bagunça, e a Elizete veio me dizer que meu pai ia almoçar com o Velho pra colocar uns panos quentes na situação.
Na 85?
Isso, na churrascaria do Velho. Eu voltei pra casa do meu pai, tomei um banho, troquei o curativo e fiquei descansando.
Discutiram feio nesse almoço, pelo que eu soube.
Pois é. Meu pai voltou à tardezinha e me contou. Ele acabou oferecendo uma compensação.
Que o Velho aceitou.
Aceitou, né. Fez todo o cu doce do mundo, mas aceitou.
Mas as coisas ainda ficaram mal aparadas.
Ficaram. Foi uma bagunça desgraçada.
Quase sempre é, pequena.
Voltei pra casa uns dias depois e não pisei mais em Goiânia desde então. Achei melhor dar um tempo.
É o melhor a fazer.
Ela concorda com a cabeça e se levanta.
Uma bagunça desgraçada, repete, pensativo.
Outro aceno de concordância enquanto dá alguns passos rio adentro. Fica ali por um bom tempo, de costas para ele. Toma mais um gole de cachaça. Quase no fim. Quase . Os olhos se voltam para o céu por um instante. Talvez se chovesse, pensa. As gotas de chuva no rio. Água na água. Mas, e daí se chovesse? As costas ardem com o sol. Um dia virá um incêndio de verdade. Um incêndio pra valer. Era isso que falava na noite anterior, largada no chão do banheiro? Sorri. Fogo. Sim, era isso. Ou coisa parecida. Quando afinal se vira, ele já acendeu outro cigarro. Sente que precisa dizer alguma coisa. O quê? Não faz ideia. Mais um gole de cachaça e: Porra, eu não fui lá no Abaporu pra matar ninguém, não.
Eu sei.
Só queria resolver a bosta do problema.
Eu sei.
Problema que nem era meu.
Eu sei.
Pois é, diz e sai da água, os braços largados ao longo do corpo, a garrafa batendo contra a coxa direita. Fica parada defronte à cadeira, de costas para o rio. Outro gole. Devagar, pensa. Devagar? Não. Devagar é o caralho. E o encara: Cê falou com o Velho?
Falei, sim.
E?
Daquele jeito.
De que jeito?
Você sabe. Com essa história entalada na garganta.
Mesmo depois de receber a compensação.
Mesmo depois de receber a compensação.
Ela faz que sim com a cabeça, exausta. Pois é. Esse tipo de coisa nunca se resolve, nunca vai embora.
Acho que não.
Ainda mais com o Velho.
Acho que não.
Certeza que não.
Eu… não sei o que dizer.
Não tem o que dizer. Não tem o que fazer. Ele nunca aceitou isso de não controlar o meu pai.
Os dois são muito teimosos.
Inferno, ela diz, sentando-se outra vez.
Ele apaga o cigarro; é o último, mas há outro maço no porta-luvas do carro. Joga a latinha cheia de guimbas na sacola, depois pega a garrafa de água mineral, abre e toma um gole, depois outro, e mais outro, e então fica com a garrafa vazia sobre o colo, como se não soubesse o que fazer com ela.
Enquanto isso, meio que espelhando alguns dos gestos do parceiro, ela mata a cachaça com uns goles curtos e reencaixa a rolha, mas não retém o litro vazio — deixa cair e rolar pelo chão, na direção do rio. Adeus, parceira. Quase chega à água. Rolando. Mais alguns centímetros e. Descer o rio. Fica olhando para ela. Podia jogá-la na água. Assim, sem mais nem menos. Sem que nem por quê. Ou não. Não, não. Jogá-la, sim, mas com algum propósito. Aí, sim. Escrever alguma coisa num pedaço de papel, meter ali dentro e (aí, sim) jogar a porra da garrafa na bosta do rio. Mas. Não. Escrever? Escrever o quê? No momento, não tem nada a dizer para ninguém. Nada a informar. Nada a segredar. Nenhum mapa do tesouro. Nenhum tesouro. Nada. Um aviso, quem sabe. Sim. Um aviso. Fique longe do Abaporu. Se precisar ir até lá, não vá bêbada e desarmada. Fique longe de Goiás. Não. Melhor deixar a garrafa como e onde está. Vazia, a poucos centímetros da água. Longe da sacola com os restos. Longe do lixo. Vazia. A outra garrafa no carro, sob o banco do passageiro. Cheia. Passageira. Buscar daqui a pouco. Eu sou a passageira. Devagar? Devagar é o caralho.
No que está pensando?
Em buscar mais cachaça.
Eu busco.
Cuidado pra não pisar no meu vômito.
Quero pegar outro maço de cigarros.
Não.
Não o quê?
Espera.
O quê?
Espera um pouco. Fica aqui comigo.
Ok.
Mais um bom tempo olhando para a garrafa vazia no chão, perto da água, depois para os dedos dos pés, as pernas esticadas, depois para a outra garrafa, também vazia, que ele ainda segura.
Viajo de novo daqui a uns dias.
De novo?
De novo.
E quando é que volta?
Creio que no começo de junho.
Volta os olhos para o rio. Tá bom.
Você vai ficar bem?
Acho que sim.
Acha que sim?
Acho que consigo me virar sem você.
Tenho certeza disso, ele sorri. Tenho certeza que consegue.
Se você diz.
Eu digo.
Tá bom, então.
Antes de viajar, devo me encontrar outra vez com o Velho. Se eu sentir qualquer sinal de problema, dou um jeito de te avisar.
Certo. Obrigada.
Enquanto isso, permaneça quieta lá em Brasília.
Certo.
Até a poeira abaixar.
Certo.
Faça isso.
Vou fazer isso.
Ótimo.
Tô fazendo isso.
Ótimo.
Se preocupa, não. Eu sei me cuidar.
Sim. Você sabe se cuidar, pequena.
Isso vai se resolver.
Vai, sim. Isso vai se resolver.
De um jeito ou de outro.
De um jeito ou de outro.
Os olhos de ambos se perdem nos arredores. Sem cigarros, sem cachaça. Por enquanto. Até que um deles se levante e vá até o carro e contorne o vômito e pegue o outro maço no porta-luvas e a outra garrafa debaixo do banco. Melhor esperar mais um pouco, ela pensa. Melhor não saltar da ressaca pro porre. Melhor não saltar direto, pelo menos. Tem o dia todo. Eles têm o dia todo. Aproveitar o dia. Sexta-Feira da Paixão. Aproveitar a paisagem. Primeiro de Abril. Um bom lugar pra acampar. Isso é engraçado. Longe do resto. Justo num 1º de abril? Longe. Por que me abandonaste? Longe do quê? Te abandonei porra nenhuma, é 1º de abril. Sorri, olhando para o curativo no lado esquerdo da barriga. Um belo corte. Trago o corte comigo. Um corte: fui cortada: alguém me cortou. As coisas mal aparadas. Compensação paga. Um chute no peito, um corte na barriga. Compensações. Uma merda, tudo uma merda. Toda compensação é uma merda. A merda escorrendo pelas pernas do desgraçado. A puta sentada no sofá. Moça, não puta. Fodida por dentro e por fora. Porque alguém precisa se foder. Nariz, boca, dentes. Fodida de novo e de novo. Depois furada uma vez, duas, quatro, setenta vezes sete. Fodida por um imbecil. Rosto, pescoço, peitos. Fodida a troco de nada. Se eu não estivesse bêbada e apalermada. Não, não posso me culpar por causa disso. Se eu tivesse pensado. Mas fiz o melhor que pude, moça. Fodida a troco de. Fui correndo pra lá, não fui? Estrebuchando, morrendo. Fui e quase me estrepei. Morrendo. Fui e matei o desgraçado. Matando. A troco de nada. Matei. Troco (compensação?): os bagos estourados a bala. Estrebuchando. Não, não que isso sirva de consolo. Até morrer. Os mortos não serão consolados. (Clara que o diga, mas é melhor não pensar nisso agora.) (Evite pensar nisso.) (Evite pensar nela.) (Evite pensar em todas aquelas coisas.) Bagos estourados a bala: pelo menos isso. Os mortos não serão consolados, ninguém será consolado. Desfeito em merda e sangue. Não há consolo possível para ninguém. Mesmo assim, morto. Pelo menos isso. Desfeito em merda. Pelo menos isso. Desfeito em sangue. Pelo menos isso. Agora, repita um milhão de vezes: pelo menos isso. E esconda a porra do choro.
Isso vai se resolver, ele repete.
Um aceno com a cabeça, uma concordância tímida.
Ele estica o braço esquerdo e coloca a garrafa de água mineral junto com as demais, entre as cadeiras, como se não estivesse vazia.
Olha, ela diz, apontando na direção do rio.
O quê?
Ali. Descendo.
Uma enorme câmara de ar desce o rio. Preta, girando em meio às pedras; pneu de caminhão ou coisa que o valha.
Parece que alguém perdeu a boia.
Ele sorri, levantando-se. Tomara que não tenha se afogado.
Sim, ela concorda, também sorrindo. Pelo menos isso.

………