Filmes da minha vida. A lista é incompleta porque sou incompleto.
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0.
Vá e Veja
[Idi i Smotri]
Elem Klimov, 1985
Um passeio na floresta. Aquele do qual nunca retornamos.
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1.
Vidas Amargas
[East of Eden]
Elia Kazan, 1955
São duas da manhã e estou sentado no tapete, próximo da TV. Próximo demais, pois não posso aumentar o volume sem acordar os meus pais. O filme dublado é sobre uma sucessão de afastamentos. A mãe, o pai, os irmãos. A narrativa ecoa o Livro, tanto que só a morte os aproxima.
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2.
O Poderoso Chefão – Parte II
[The Godfather – Part II]
Francis Ford Coppola, 1974
Só é possível salvar a família perdendo-a. O vácuo de poder precisa ser preenchido com sangue. De novo, dois irmãos e um pai que já se foi. Ao final, o homem sozinho fita a extensão trevosa de seus domínios com os olhos que ele próprio vazou. É como se Édipo, ciente de tudo, insistisse em permanecer no trono. Uma inversão impossível, eu sei. Michael Corleone se sustenta no vazio.
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3.
Touro Indomável
[Raging Bull]
Martin Scorsese, 1980
Ele não é um animal. Acaso o fosse, não seria animado pela raiva.
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4.
Nascido Para Matar
[Full Metal Jacket]
Stanley Kubrick, 1987
Na mecânica da guerra, as peças sangram. A cidade arruinada é uma sombra para além das chamas. Eles matam, marcham e cantam. Gigantes verdes escuridão adentro.
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5.
Os Pássaros
[The Birds]
Alfred Hitchcock, 1963
O grasnar e o bater de asas são a única música possível quando, arrancados os olhos, vislumbramos o Fim.
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6.
Onde Começa o Inferno
[Rio Bravo]
Howard Hawks, 1959
Fundamentação de uma metafísica dos costumes.
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7.
Chinatown
Roman Polanski, 1974
À beira do deserto, alguém morre afogado. O desfecho é particularmente feliz.
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8.
Rastros de Ódio
[The Searchers]
John Ford, 1956
Delimitado o espaço, podemos percorrê-lo. E, no que o percorremos, somos delimitados por ele.
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9.
Soberba
[The Magnificent Ambersons]
Orson Welles, 1942
O primeiro filme que tomaram de Welles. A história de uma família contada pelas sombras, dela e dos outros. E toda história de família é uma história de terror.
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10.
Amarcord
Federico Fellini, 1973
O telejornal noticiou a morte de Fellini. Depois, para homenageá-lo, anunciaram a exibição de Amarcord para logo mais, na boca da madrugada. Meu pai disse: “Eu vejo com você”. Nunca estivemos tão próximos.
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11.
Ran
Akira Kurosawa, 1985
KING LEAR: Who put my man i’ the stocks? (Tucket within.)
Shakespeare, King Lear (Ato 2, cena IV).
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12.
Bonnie & Clyde – Uma Rajada de Balas
[Bonnie and Clyde]
Arthur Penn, 1967
Nunca morrer foi tão bonito.
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13.
O Batedor de Carteiras
[Pickpocket]
Robert Bresson, 1959
A transcendência possível em uma arte tão ancorada na imanência.
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