Dices que nada se pierde
y acaso dices verdad,
pero todo lo perdemos
y todo nos perderá.
Antonio Machado
The Counselor, aqui rebatizado como O Conselheiro do Crime, é sobre um homem condenando-se a um hiato de dor inaudita que se prolongará pelo resto de sua vida. Ou seja, ele para sempre estará encalacrado na passagem entre o mundo de onde veio e um outro, com o qual flertou. Como alguém trata de lembrá-lo a certa altura, as escolhas foram feitas lá atrás.
Logo, o que o filme de Ridley Scott (roteirizado por ninguém menos que Cormac McCarthy) oferece é o estabelecimento gradual da realidade de um certo mundo, aquele outro, realidade que o personagem-título deveria conhecer antes de fazer suas escolhas. Ele quer ganhar uma bolada com uma transação de drogas. É um neófito. Algo sai errado e, claro, os chefes do cartel mexicano cobrarão a fatura. Cabeças arrancadas. Corpos em barris.
Enquanto assistia ao desespero crescente (e mais do que justificado) do pobre coitado, pensei no que o irmão de “Nucky” Thompson diz ao próprio em um episódio de Boardwalk Empire: “Não dá pra ser meio gangster”. Ou se é por inteiro, ou não. É o que lhe diz, noutras palavras, o intermediário do negócio. É o que todos lhe dizem.
Há um certo parentesco do protagonista com o Llewelyn de No Country for Old Men. Ambos passeiam por uma realidade que não admite tal expediente. Colocando-se naquele hiato, eles acabam partidos ao meio. E, olhando daqui, a reação do outro é sempre desproporcional, engolindo não só o passeador como, também, os que estão ao seu redor. O mundo de Llewelyn e dos seus cessa com a morte de cada um deles. O mundo do advogado, desgraçadamente, não cessará tão cedo.
Assim, na medida em que encarcera o advogado no dolorosíssimo intervalo entre dois mundos, o filme também restitui à morte algo de sua relevância. Tal relevância, claro, é tão maior e evidente quanto a dor do personagem. Ele se torna o que perdeu; a perda passa a ser todo o seu mundo, o qual, reitero, não cessará tão cedo.
E, como diz alguém a certa altura, o luto é algo sem valor, pois não pode ser trocado ou vendido. O luto é inegociável. A partir do momento em que alguém é constituído única e exclusivamente pelo luto, tal pessoa apresenta-se-nos sem valor, pois ela é o que lhe foi arrancado. Ele é o que não é mais, o que deixou de ser, o que partiu, está ausente.
Não por acaso, o filme é dedicado ao irmão de Ridley Scott, o também cineasta Tony, que se matou em agosto de 2012.