Blue Jasmine é uma tragédia que só se revela enquanto tal por meio de uma reviravolta no último terço, quando a hybris da protagonista é explicitada. A questão é que toda a desgraça de Jasmine, enfocada na maior parte do tempo e até ali com uma leveza enganosa, foi causada por ela própria. E Allen é tão genial no modo como traz isso à tona porque usa o enteado como estopim da revelação. O rapaz está ali, inacreditavelmente inteiro após tudo o que passou, exilado, de certa forma, e é encontrado pela madrasta. Ela adentra o espaço no qual ele trabalha, uma loja de instrumentos musicais usados. O lugar é de uma escuridão oracular, e ela o adentra apenas para se enxergar, apenas para que ele a exponha para si própria. Veja, foi você. Não se lembra? Você causou tudo isso. Você fez tudo isso. É como Édipo diante da cidade empesteada, descobrindo ou aceitando que a causa de toda a desgraça é ele mesmo e não outrem. Édipo fura os próprios olhos. Jasmine não chega a tanto, ou talvez chegue metaforicamente: ela faz a passagem, ao que parece definitiva, para o mundo outro, alucinado, que bordejava há algum tempo. É a quebra final. Mais do que nunca, e como a personagem trágica que é, ela está absolutamente sozinha.
Jasmine enlouquece
- Autor do post De André de Leones
- Data do post
- Categorias Em Coisas que a gente vê no escuro
- Tags "Blue Jasmine", Cinema, Woody Allen