O sr. Martim Vasques da Cunha, conforme linkei AQUI, escreveu sobre Eufrates para o caderno Aliás do Estadão. Ele também teceu alguns comentários acerca do livro no Twitter, em uma thread publicada meses atrás. Tomo a liberdade de colar abaixo o que ele tuitou:
EUFRATES, de André De Leones (@d_leoness) é um dos grandes romances de 2018 pelos seguintes motivos: (a) Finalmente, depois do Hades que foi “Abaixo do Paraíso”, De Leones chega a uma serenidade formal e a uma maturidade existencial impressionantes.
(b) Ainda em termos formais, nenhum autor nacional surgido nos últimos dez anos tem o tesão estilístico dele (com a possível exceção de Pelizzari e Terron): De Leones vai de James Joyce a David Foster Wallace, sem deixar de prestar várias homenagens a Don DeLillo.
(c) Como se não bastasse, EUFRATES tem grandes cenas de sacanagem, muito bem escritas (algo que só James Ellroy sabe fazer atualmente), e uma sequencia de ácido lisérgico que é capaz de convencer o leitor mais conserva – no caso, eu – de que se pode encontrar alguma paz ali.
(d) É um romance adulto, de temas adultos, escrito por um adulto, a ser lido por adultos, mas que não se esquece jamais do jovem que foi e que poderia ter sido. Portanto, não há amargura nele, apesar do confronto com o caos – que é vencido, mesmo de maneira provisória.
(e) O tema central do romance é a paralisia – algo que De Leones já contemplava nos romances anteriores, mas que aqui alcança um desenvolvimento mais suave, o que possibilita a abertura para uma redenção intramundana que, contudo, é melhor do que abraçar o niilismo puro.
(f) Os personagens Jonas e Moshe são o coração do livro. Porém, são nas digressões que encontramos outras pérolas, como a terrível cena com Giovanna, a sequência do jogo de basquete com João Gabriel e o hilário momento dos sapatos apertados nos pés doloridos de Dona Cida.
(g) Essas digressões são fundamentais para que De Leones abrace a forma ampla do romance como um modo de conhecimento peculiar da realidade, tal como Milan Kundera nos avisa em “Os Testamentos Traídos”.
(h) A prova desse tipo de intenção do autor está no final, quando Moshe e seu pai, Miguel, discutem a situação do Brasil durante as manifestações de Junho de 2013, com direito a referências cifradas a Eric Voegelin e Paulo Eduardo Arantes.
(i) EUFRATES, com sua estrutura aparentemente fragmentada, mas unido pelo tema das escolhas que devemos fazer quando estamos mergulhados na *stasis* da alma, fala de um Brasil completamente caótico, sem possibilidade de salvação coletiva.
(j) Contudo — e talvez por isso mesmo — é por causa deste mesmo caos que o país dá chance a uma salvação – ou melhor, a uma *comunhão* – que acontece somente entre as pessoas, entre os indivíduos, entre os amigos e com quem que restou das nossas famílias.
(l) (Se isto não é o que nos conforta para sempre, é, ao mesmo tempo, mais do que o suficiente nos nossos dias.)