Jerusalém é branca.

Trecho do meu romancemprogresso.

No dia em que aterrissaram em Tel Aviv, depois de um rápido interrogatório no aeroporto, receberam os vistos e rumaram para Jerusalém. Sonolento, Arthur viu através da janela do monit sherut uma cidade limpa, esvaziada (era tarde), em que avenidas largas davam lugar a ruas estreitas à medida que o motorista manobrava para deixar os diversos passageiros, as construções iguais constituídas pelos mesmos grandes blocos creme-cromáticos; não parecia real, ou talvez fossem o sono e o cansaço, as coisas como que descoladas umas das outras, os prédios descolados do chão, o próprio asfalto das ruas descolado do chão, a cidade descolada do mundo — tudo separado do resto, atirado ao vazio da mesma forma como Ben Gurion fizera com suas pernas ao posar para aquela fotografia. Arthur fechou os olhos por um instante, pensando que, talvez, nada definisse melhor Jerusalém do que essa ideia ou imagem de uma cidade-bolha flutuando indefinidamente, perdida numa espécie de vácuo a-histórico fadado a eternas e, desgraçadamente, nunca monótonas — porque sangrentas, caóticas — repetições.
Chegaram exaustos ao hostel e, depois de fazer o check-in e acomodar as bagagens no quarto, só tiveram forças para atravessar a Jaffa e comer um sanduíche no Burger King e beber algumas cervejas sentados a uma mesa no calçadão da Ben Yehuda. Teresa quis comer um falafel, mas Arthur disse que era melhor não comer nada de muito diferente naquela primeira noite. De volta ao quarto, fecharam as cortinas, ligaram o ventilador e dormiram inteiramente vestidos, como se talvez precisassem fugir dali a qualquer momento, no meio da noite.
Não fugiram, claro.
Acordaram cedo, com o barulho do trânsito e das obras, e resolveram que o primeiro lugar a visitar seria a Cidade Velha. Estavam a um quilômetro do Portão Jaffa. Caminhando pela calçada, esbarrando em soldados, turistas, judeus e judias ultraortodoxos, haredim, e crianças em meio à poeira levantada pelos operários, ele perguntou o que ela estava achando. Teresa não respondeu de imediato. Minutos depois, sentados a uma mesa do Café Aroma naquela mesma calçada, ela se limitou a dizer:
— Jerusalém é branca.

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